Anteontem, exatamente (23/10), há 20 anos, era lançado o "Mellon Collie and the Infinite Sadness" - sempre uma influência.
Estende-se da música propriamente dita à poesia incluindo o emprego de modos musicais de caráter patético, descrições de cenas desencorajantes - sobretudo as que inspiram o temor da morte e o desapreço dos deuses - a expressão de lamentações e queixumes, atribuída a heróis ilustres, narrativas não edificantes, representações trágicas, que induzem ao domínio das paixões violentas, e as cômicas, favoráveis ao desequilíbrio da conduta.
domingo, 25 de outubro de 2015
sábado, 10 de outubro de 2015
Dr. Paralaxe vs o Dragão do Tempo
por Thiago Pereira
“O ‘Quartzo’ não nasceu. Como bom cristal que é ele sempre existiu!”
A conclusão acima, do vocalista Fred HC, veste com precisão essa roupa de luxo que ele e o guitarrista Rafael teceram para celebrar as comemorações de dez anos da Paralaxe. O mineral que se usa para medir o tempo, cuja vibração determina a passagem das horas na grande maioria dos relógios, localiza o quart(z)o disco do grupo como museu de grandes novidades, nostalgia do futuro, todo e nenhum tempo concentrado no espaço de um vinil que, em si é também a metáfora do cristal (quartzo) no recorte da durabilidade material, se comparada à mídia digital onde a obra da banda estava assentada.
(Por aqui viajo: heterotopia foucaltiana modulada pelo pop? “Don´t Look Back”, dizia Dylan. “Be Here Now”, completava George Harrison. Ah, o pop e a ciência, como dispositivos de novas sensibilidades e experiências como apostava Sontag...)
Quem conhece os caras (dois enormes artistas que atuam como médicos nas horas vagas...) pode até supor que, desta vez, o lado cientista maluco pendeu mais na balança que a overdosagem de cultura pop que sempre povoou as letras e os arranjos da banda. Do alto de quem entrou meio desavisado num Matriz (espaço histórico da música independente mineira) vazio numa noite do meio de maio de 2005 e foi imediatamente seqüestrado pela banda-e desde então tem tentado capturar os estilhaços estético/poético/sonoros do grupo- a resposta vem de um verso escutado naquela noite:
“Eu acho que passei do tempo”.
Pretensão dos infernos essa não? Mas, convenhamos, a dupla nunca se furtou a isso. E, bem, de certa forma, com esse disco, o tempo alcançou a Paralaxe. Mas isso demandou uma manobra bastante engenhosa por parte dos caras.
Há tempos faço o exercício de tentar crackear o template sonoro da banda. Separar os elementos formativos de um todo me levou a isso:
Paralaxe=música eletrônica + canções x rompantes de guitarra/beats alucinados + esfinges líricas [literatura + pop como subjetivação e não apenas como rótulo] – medo do exagero e das possibilidades de experimentação
A conta fechou bonito em três ótimos discos, cada um deles equacionando esses vetores de forma mais ou menos balanceada. No primeiro, “Paralaxe” (2005), fomos apresentados à dosagem de eletro/acústica travestindo pepitas cancionais; o segundo “Under Pop Pulp Fiction” (2008) se esbalda no carnaval de imagens e de sentidos, pesando bem a mão nos efeitos e nas narrativas; o terceiro “Deus Ex-Machina”, é fruto de insuspeita sobriedade lírica e de produção preciosa. Habemus, portanto, uma face personalíssima e personalista, um caso raro de estudo e fruição na cena belo-horizontina dos anos 00. Poucas bandas soam tão contemporâneas neste balaio quanto a Paralaxe. Em minha opinião, poucas bandas foram tão subestimadas no período. Mas... eu acho que...passei do tempo?
Portanto, de cara, “Quartzo” trazia em si um desafio prévio: desnudar todas essas personas, num delicado processo de seleção cancional, como qualquer processo compilativo. Mas remexer gavetas da memória, simplesmente, não é a onda desses doutores.
Homens-pop da ciência partem de premissas não óbvias.
Homens-pop da ciência tentam o impossível.
Homens-pop da ciência invertem o medidor do tempo e fazem do “Quartzo” um aliado.
Fizeram o tempo, em estratégia stoneana (não estamos falando afinal de pedras, de cristais?) estar (nos) lado(s) deles, A e B, o atual passado, o ex-futuro e nesse intervalo entre o cristal tocar o sulco do vinil, o presente, pleno. O contemporâneo responde a dúvida: achou errado, você não passou do tempo.
Você guarda o tempo em si.
Todos os tempos.
De novo: pretensão dos infernos essa não?
(Bem, adianto aqui que os caras têm na gaveta um disco biográfico sobre o simbolista Rimbaud. Passar uma temporada nos Hades da grandeza artística interessa muito a eles...)
O que se faz aqui é confirmar que, na verdade, as músicas lançadas anteriormente, nos três CD´s, eram na verdade releituras. Hein? Releituras do quê? Releituras eletrônicas de algo do passado! Releituras delas mesmas em suas versões primárias. O que nasceu orgânico- possivelmente de um violão, de um papel, de um riff de guitarra- e criou texturas externas, glacês eletro (entro) nizados, saiu da terra e chegou ao mundo já pronto, reprocessado nos trabalhos anteriores lançados pela banda.
Agora é back to the bone, dissecar, buscar a origem, revelar sons e sentidos bem primários e materializáveis da formação deles como artistas. Para o ouvinte é privilégio, poder checar com tanta precisão a alma (um trabalho que revela, no microscópio, fatos importantes como o grande cantor que Fred é; o puta guitarrista que o Rafa é; os espíritos inquietos por trás da polifonia lírica toda) e o corpo (a impressionante qualidade dos arranjos; o supremo cuidado com a parte visual com a assinatura de Eduardo Recife, a gravação preciosa do Baiano) da estrutura Paralaxe.
Eis o “Quartzo”, portanto: espécie de anatomia da verdade paralaxiana. Quartzo, algo que está sim, escondido na terra e dela faz parte, “mas que proporciona difração de matizes ao receber um feixe de luz incolor, que tem pulsação temporal e calibragem telúrica”, como nos contam eles.
Ouso aqui chamar essa pulsação e calibragem de disco de vinil. Origem é origem, the song remains the same, a ciência do pop é sábia. Pouco a ver com a recuperação fetichista da mídia vintage, não há subentendido aqui o slogan meio hype do vinil como futuro. Tudo a ver com o propósito de revelar o que no passado estava escondido em efeitos mil, vontades possibilitadas pela era da informação, pelos suportes digitais.
Não. O vinil serve aqui como aparato analógico pra desvendar o presente. Eles mesmos assumem: além do aspecto de comemoração, há um desafio em jogo, um propositado “sair da zona de conforto”.
Para eles, pelo aspecto orgânico da execução dos instrumentos e da restrição de possibilidades de tentativa-erro impostas pela fita magnética.
Para nós, os ouvintes, temos a oportunidade de tentar perceber uma narração interna oculta da obra, não essa, fixada no vinil, mas de todo o espectro paralaxiano.
Portanto, escuto aqui “Juliano Doido”, “Retrato” “Lázaro”, “Magdalena”, “Clubber do Milharal” como se não as conhecesse e não as acompanhasse desde uma noite fria, há uma década. Brindo com eles essa coragem de se auto-autopsiar, com a sensação de que, se eu abrisse meu corpo (e alma), também ia me surpreender com o que encontraria lá. Isso já motivo o suficiente para comemorações.
Para quem está sendo apresentado à banda agora, sugiro então o caminho inverso: comece nesse “Quartzo” para depois ir percorrendo os discos anteriores. A cronologia não é o que mais se aplica por aqui: essa banda não passou do tempo, afinal.
“O ‘Quartzo’ não nasceu. Como bom cristal que é ele sempre existiu!”
A conclusão acima, do vocalista Fred HC, veste com precisão essa roupa de luxo que ele e o guitarrista Rafael teceram para celebrar as comemorações de dez anos da Paralaxe. O mineral que se usa para medir o tempo, cuja vibração determina a passagem das horas na grande maioria dos relógios, localiza o quart(z)o disco do grupo como museu de grandes novidades, nostalgia do futuro, todo e nenhum tempo concentrado no espaço de um vinil que, em si é também a metáfora do cristal (quartzo) no recorte da durabilidade material, se comparada à mídia digital onde a obra da banda estava assentada.
(Por aqui viajo: heterotopia foucaltiana modulada pelo pop? “Don´t Look Back”, dizia Dylan. “Be Here Now”, completava George Harrison. Ah, o pop e a ciência, como dispositivos de novas sensibilidades e experiências como apostava Sontag...)
Quem conhece os caras (dois enormes artistas que atuam como médicos nas horas vagas...) pode até supor que, desta vez, o lado cientista maluco pendeu mais na balança que a overdosagem de cultura pop que sempre povoou as letras e os arranjos da banda. Do alto de quem entrou meio desavisado num Matriz (espaço histórico da música independente mineira) vazio numa noite do meio de maio de 2005 e foi imediatamente seqüestrado pela banda-e desde então tem tentado capturar os estilhaços estético/poético/sonoros do grupo- a resposta vem de um verso escutado naquela noite:
“Eu acho que passei do tempo”.
Pretensão dos infernos essa não? Mas, convenhamos, a dupla nunca se furtou a isso. E, bem, de certa forma, com esse disco, o tempo alcançou a Paralaxe. Mas isso demandou uma manobra bastante engenhosa por parte dos caras.
Há tempos faço o exercício de tentar crackear o template sonoro da banda. Separar os elementos formativos de um todo me levou a isso:
Paralaxe=música eletrônica + canções x rompantes de guitarra/beats alucinados + esfinges líricas [literatura + pop como subjetivação e não apenas como rótulo] – medo do exagero e das possibilidades de experimentação
A conta fechou bonito em três ótimos discos, cada um deles equacionando esses vetores de forma mais ou menos balanceada. No primeiro, “Paralaxe” (2005), fomos apresentados à dosagem de eletro/acústica travestindo pepitas cancionais; o segundo “Under Pop Pulp Fiction” (2008) se esbalda no carnaval de imagens e de sentidos, pesando bem a mão nos efeitos e nas narrativas; o terceiro “Deus Ex-Machina”, é fruto de insuspeita sobriedade lírica e de produção preciosa. Habemus, portanto, uma face personalíssima e personalista, um caso raro de estudo e fruição na cena belo-horizontina dos anos 00. Poucas bandas soam tão contemporâneas neste balaio quanto a Paralaxe. Em minha opinião, poucas bandas foram tão subestimadas no período. Mas... eu acho que...passei do tempo?
Portanto, de cara, “Quartzo” trazia em si um desafio prévio: desnudar todas essas personas, num delicado processo de seleção cancional, como qualquer processo compilativo. Mas remexer gavetas da memória, simplesmente, não é a onda desses doutores.
Homens-pop da ciência partem de premissas não óbvias.
Homens-pop da ciência tentam o impossível.
Homens-pop da ciência invertem o medidor do tempo e fazem do “Quartzo” um aliado.
Fizeram o tempo, em estratégia stoneana (não estamos falando afinal de pedras, de cristais?) estar (nos) lado(s) deles, A e B, o atual passado, o ex-futuro e nesse intervalo entre o cristal tocar o sulco do vinil, o presente, pleno. O contemporâneo responde a dúvida: achou errado, você não passou do tempo.
Você guarda o tempo em si.
Todos os tempos.
De novo: pretensão dos infernos essa não?
(Bem, adianto aqui que os caras têm na gaveta um disco biográfico sobre o simbolista Rimbaud. Passar uma temporada nos Hades da grandeza artística interessa muito a eles...)
O que se faz aqui é confirmar que, na verdade, as músicas lançadas anteriormente, nos três CD´s, eram na verdade releituras. Hein? Releituras do quê? Releituras eletrônicas de algo do passado! Releituras delas mesmas em suas versões primárias. O que nasceu orgânico- possivelmente de um violão, de um papel, de um riff de guitarra- e criou texturas externas, glacês eletro (entro) nizados, saiu da terra e chegou ao mundo já pronto, reprocessado nos trabalhos anteriores lançados pela banda.
Agora é back to the bone, dissecar, buscar a origem, revelar sons e sentidos bem primários e materializáveis da formação deles como artistas. Para o ouvinte é privilégio, poder checar com tanta precisão a alma (um trabalho que revela, no microscópio, fatos importantes como o grande cantor que Fred é; o puta guitarrista que o Rafa é; os espíritos inquietos por trás da polifonia lírica toda) e o corpo (a impressionante qualidade dos arranjos; o supremo cuidado com a parte visual com a assinatura de Eduardo Recife, a gravação preciosa do Baiano) da estrutura Paralaxe.
Eis o “Quartzo”, portanto: espécie de anatomia da verdade paralaxiana. Quartzo, algo que está sim, escondido na terra e dela faz parte, “mas que proporciona difração de matizes ao receber um feixe de luz incolor, que tem pulsação temporal e calibragem telúrica”, como nos contam eles.
Ouso aqui chamar essa pulsação e calibragem de disco de vinil. Origem é origem, the song remains the same, a ciência do pop é sábia. Pouco a ver com a recuperação fetichista da mídia vintage, não há subentendido aqui o slogan meio hype do vinil como futuro. Tudo a ver com o propósito de revelar o que no passado estava escondido em efeitos mil, vontades possibilitadas pela era da informação, pelos suportes digitais.
Não. O vinil serve aqui como aparato analógico pra desvendar o presente. Eles mesmos assumem: além do aspecto de comemoração, há um desafio em jogo, um propositado “sair da zona de conforto”.
Para eles, pelo aspecto orgânico da execução dos instrumentos e da restrição de possibilidades de tentativa-erro impostas pela fita magnética.
Para nós, os ouvintes, temos a oportunidade de tentar perceber uma narração interna oculta da obra, não essa, fixada no vinil, mas de todo o espectro paralaxiano.
Portanto, escuto aqui “Juliano Doido”, “Retrato” “Lázaro”, “Magdalena”, “Clubber do Milharal” como se não as conhecesse e não as acompanhasse desde uma noite fria, há uma década. Brindo com eles essa coragem de se auto-autopsiar, com a sensação de que, se eu abrisse meu corpo (e alma), também ia me surpreender com o que encontraria lá. Isso já motivo o suficiente para comemorações.
Para quem está sendo apresentado à banda agora, sugiro então o caminho inverso: comece nesse “Quartzo” para depois ir percorrendo os discos anteriores. A cronologia não é o que mais se aplica por aqui: essa banda não passou do tempo, afinal.
quinta-feira, 8 de outubro de 2015
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